Observo que, no Brasil, parte das pessoas no final da fase adulta e início da velhice tem dificuldade de estabelecer novas relações sociais, gerando enxugamento no círculo de apoio.
Pensando nisso, comecei a analisar o contexto social do idoso à semelhança de florestas: está arborizado ou desmatado? Se for o segundo caso, quais ações podem acontecer para que haja o reflorestamento social, na medida do desejo de cada um?
O desmatamento social pode acontecer durante todo curso de vida. Em alguns momentos, paramos de nos relacionar com algumas pessoas próximas. Também diminuímos muito o contato com elas devido mudanças de escola, faculdade, residência e cidade, estado ou país… Mudanças de emprego ou projeto, desemprego, separação ou divórcio, doenças incapacitantes e mortes, entre outros. Tais acontecimentos podem abrir espaço para o processo de reflorestamento social.
E o que venha ser isso? Quando criamos novos laços relacionais nos ambientes que começamos a frequentar como escola, vizinhança, cidade, emprego, instituições de recolocação profissional, cursos, etc.
Desmatamento e reflorestamento social são processos bastante individuais, têm contornos culturais diferenciados e variam em relação ao momento histórico em que se vive.
A questão não é o desmatamento social, pois perdas (em maior ou menor grau) acontecem a vida toda, com todo mundo. O desafio aparece quando o reflorestamento não ocorre devido a crenças pessoais e sociais limitantes.
A primeira, individual, é a crença de morte próxima. É comum pessoas saudáveis entre 60 e 90 anos dizerem que:”não vale a pena o esforço de estabelecer novas relações, desenvolver habilidades ou adquirir conhecimentos por que logo morrerão.
Respondo que pessoas longevas chegaram até os 120 anos, ou seja, é possível que vivam mais 60, 50, 40, 30 anos. Essa informação normalmente é recebida com espanto pelos meus interlocutores e percebo que não se prepararam para viver tanto.
No imaginário social, a velhice está associada à improdutividade, inatividade, fragilidade e doença. Dessa forma, é frequente observarmos discursos e ações limitantes em relação às pessoas com 60 anos ou mais.
Exemplo claro é a dificuldade de encontrar postos no mercado de trabalho. Também acompanho filhos e netos que acreditam ser tarde demais para seus pais e avós frequentarem escolas ou universidades. Ou sugerem que não saiam de casa porque sofreram quedas e podem cair novamente. Ou acham que devem manter seus casamentos infelizes porque estão muito velhos para buscar a felicidade em outras relações.
Essas crenças limitantes impedem ou dificultam que o reflorestamento social aconteça.
Só que não precisa ser assim.
É importante que a velhice seja entendida como momento de potência, realizações e conexões. Qualquer momento é bom para iniciar o reflorestamento social, caso o idoso queira isso. Como?
Retomando ou dando início a novos projetos (de lazer ou de trabalho), fazendo cursos, lendo livros atuais e se comunicando com seus autores (dica:basta mandar email).
Você também pode entrar em contato e participando de grupos de idosos e redes que discutem envelhecimento ativo (no Brasil, temos o Lab 60+ (www.lab60mais.com) e o Movimento Ativo e Saudável (www.ativoesaudavel.com.br), entre muitas outras ações possíveis.
O processo de reflorestamento social pode contribuir para o idoso manter relações positivas com terceiros, sentir-se valorizado e, sobretudo, feliz.
Raquel Ribeiro
Psicóloga
Doutora em Psicologia Social pela USP
site: www.cuidadordeidosos.com.br